Gestor executivo do transporte aponta 6 elementos óbvios e fundamentais sobre transporte público que ninguém te contou
O sistema de transporte público é um direito previsto na Constituição e, para que se torne um serviço de qualidade, merece atenção de todos. Para isso, existem 6 pontos essenciais que devem ser considerados para o entendimento do sistema e podem auxiliar para a melhoria em sua eficiência e gestão.
No entanto, a omissão destes conceitos essenciais, principalmente por meio de formadores de opinião, imprensa, políticos e professores, pode fazer com que o sistema se torne um grande desserviço aos indivíduos que utilizam-no.
1. Somente indivíduos possuem desejos, e somente indivíduos se deslocam
Hoje o transporte é tratado como uma solução para os deslocamentos da coletividade, deixando de fora o mais importante: o indivíduo.
Assim, ao ignorar o princípio de que os deslocamentos se baseiam na escolha individual, perde-se a oportunidade de valorar o transporte público. Para isso o sistema tem que conhecer cada dia mais o perfil de seus clientes, quais as suas necessidades e expectativas.
2. O valor da tarifa é subjetivo
A valoração de elementos só é possível quando comparados às alternativas disponíveis, ou seja, quando determinado produto ou serviço satisfaz melhor algum objetivo em relação aos outros produtos/serviços.
Sendo assim, quando falamos de tarifa do transporte público, esta é considerada cara ou barata quando seus atributos são comparados com outra forma de deslocamento. Dependendo da qualidade do serviço prestado, até a tarifa zero pode ser cara.
Portanto, quando alguém diz que a tarifa da cidade A é a mais cara do Brasil, há um grande erro de análise pois só está sendo considerado o valor nominal da mesma, não analisando os outros fatores que estão envolvidos.
3. O problema da centralização
Ninguém consegue planejar um sistema de transporte inteiro sozinho, muito menos prever as ações de centenas de milhares de pessoas sem auxílio.
Hoje, as informações são atualizadas diariamente, segundo a segundo, em decorrência da interação livre e espontânea dos usuários, do espaço urbano e das empresas operadoras. Essa multiplicidade de informações são impossíveis de serem apreendidas e processadas por um único órgão.
Portanto, somente o Estado – que hoje planeja o serviço – não é capaz de oferecer um transporte público eficiente e aderente às reais necessidades de deslocamento da população, fazendo com que o serviço se desvalorize cada vez mais.
4. Aquilo que se vê e aquilo que não se vê
Existem muitas notícias sobre lotação de ônibus, atrasos, insatisfação dos usuários, falta de infraestrutura, etc. Mas e aquilo que não se vê? Quem fala sobre que está por trás disso tudo? São poucos.
Existe uma série de pontos que impactam diretamente o transporte, como:
- “Contratos de concessão” que aprisionam os operadores e os impedem de buscar novas soluções;
- As gratuidades e benefícios tarifários que oneram a tarifa para o usuário e diminuem o ganho dos operadores, impactam diretamente os investimentos;
- Decisões políticas em relação ao reajuste tarifário e a oferta de serviço em regiões/dias/horários não produtivos;
- A fiscalização pública que tem como objetivo central arrecadar mais recursos para o Estado, sem se preocupar com a melhoria do serviço;
- entre muitos outros fatores.
Então percebe-se que é mais fácil colocar toda a culpa na baixa qualidade do serviço prestado pelo operador do que apresentar e discutir com a sociedade as formas de tornar o transporte público mais competitivo e atrativo.
5. Inovação
É difícil ouvirmos que o transporte público deveria ser gerido com espírito empreendedor buscando sempre a inovação. No entanto, a criação de valor econômico é uma função-chave nesse processo de resgate do transporte.
Empreendedorismo é perceber oportunidades que não estão especificadas nos dados. É o ato de ver uma nova maneira de alocar meios para alcançar um objetivo. Empreendedorismo não é apenas tentar melhorar algo que já existe, é transformar. E isso deveria ser aplicado no transporte.
No entanto, lamentavelmente, o nosso modelo atual está amarrado ao “contrato de concessão” e, somado com a grande intervenção do Estado, impossibilitam a inovação do sistema. Pois é mais fácil transferir responsabilidades ao operador do que transferir também a liberdade para inovar.
6. Pare de acreditar no Estado
Estamos sempre ouvindo que o Estado tem que intervir no transporte para mitigar as “falhas de mercado”, e ele é rápido em oferecer explicações teóricas de como melhorar os resultados do transporte.
Por outro lado, quase não é falado sobre a possibilidade das falhas serem causadas pelo próprio Estado. E é fato que a intervenção estatal no transporte sempre torna as coisas piores. É um caso típico da cura ser pior do que a doença. Ademais, não há qualquer explicação sobre quem irá regular os reguladores.
Concluindo, Mark Twain certa vez disse: “O que lhe causa problemas não é aquilo que você não sabe, mas sim aquilo que você jura saber, mas que está errado”. No caso do transporte, são infelizmente ambas as coisas.
É lamentável como muitos apontam o problema e não clareiam a situação com soluções. Com isso, o transporte público no Brasil acaba caminhando à autodestruição e quando isto acontecer, culparão somente os operadores e seguirão para reestruturação do serviço com os mesmos erros do passado e que novamente se autodestruirá.
Cabe aqui uma reflexão, pois, assim como Albert Einsten disse, “Insanidade é continuar fazendo sempre a mesma coisa e esperar resultados diferentes”.
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