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Perda de 2 milhões de passageiros contribui para falência do transporte em Campina Grande

Sistema de transporte público em Campina Grande sofre perdas desde 2018 e a pandemia intensificou os problemas, pressionando empresários e Prefeitura a buscarem soluções em parceria

Foto: G1 – PB.

As perdas no setor de transporte público aumentam a cada ano. Em Campina Grande, no Agreste da Paraíba, o sistema perde cerca de 2 milhões de passageiros anualmente, de acordo com dados da Superintendência de Trânsito e Transportes Públicos de Campina Grande (STTP). Em decorrência dessa queda, o prejuízo para as empresas de ônibus chegou a quase R$ 5 milhões em apenas um semestre em 2018.

Durante a pandemia, a média de pessoas transportadas reduziu de 100 mil para 22 mil por dia. Com isso, as empresas responsáveis pelo transporte público do município alegaram prejuízo econômico e chegaram a protocolar um documento junto a STTP a fim de suspender o serviço. Entretanto, a Justiça emitiu liminar proibindo as empresas de transporte coletivo de suspenderem as atividades nesse momento de pandemia.

De acordo com o gerente de transportes da STTP, Henrique Castro, existem diversas situações que contribuem para a queda no número de passageiros. O gerente destaca “aumento no número de mototaxistas [e] o surgimento de transportes clandestinos e por aplicativo”, além do aumento de desemprego na cidade.

A fim de solucionar o problema, o atual prefeito Bruno Cunha Lima (PSD) manteve reunião com os empresários na sede da STTP na última sexta-feira, dia 22 de janeiro de 2020. Porém, não houve conclusão. “Não podemos deixar a sociedade sem o serviço, nem deixar as empresas fecharem as portas”, destacou.

Agnelo Candido, presidente do Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros de Campina Grande (Sitrans), disse que as empresas não possuem mais capacidade financeira para honrar os compromissos, inclusive pagamento de salários e vales-alimentação atrasados, e que o sistema está falido.

Como alternativa, a Prefeitura informa que o IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano) terá que sofrer reajuste para correção pela inflação, medida indicada por especialistas do setor de transporte. Porém, em nota, Bruno explicou que o repasse inflacionário é imposição legal, mas não será aplicado aumento real no imposto.

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Isso é obrigatório.
Isso é obrigatório.

Demanda de ônibus no Brasil cai menos do que em outros países durante pandemia

Moovit disponibiliza relatório do impacto no setor de transporte do mundo

Foto: Nereu Jr/WRI Brasil.

A pandemia de coronavírus gerou um impacto negativo no setor de transporte público. Os principais sistemas de transporte público no país registram perdas de 70 a 80% no número de passageiros e as empresas têm apresentando até 95% de perda de receita.

Para o acompanhamento deste impacto, desde março de 2020, o aplicativo de mobilidade urbana Moovit têm gerado um Relatório Geral do transporte público em todo o mundo. O relatório é composto através de dados anônimos de usuários do aplicativo.

Segundo o relatório, o Brasil apresentou uma queda na demanda de 51,5% no transporte público. No dia 19 de julho de 2020, Brasília registrou a menor queda do país (-36,7%), seguido por Fortaleza (-45,3%), Recife (-46,2%), Curitiba (-46,9%), Belo Horizonte (-47,7%), São Paulo (-48,4%), Rio de Janeiro (-50,2%), Salvador (-62,6%) e, a maior queda em Campinas (-64,4%)

Impacto do coronavírus (COVID-19) no transporte público em cidades brasileiras.
Fonte: Relatório Geral (Moovir, 2020).

Considerando cidades do mundo todo, as mais afetadas foram Madrid, na Espanha, e Roma e Torino, na Itália, com uma queda na demanda de cerca de 90% no transporte público. Por toda a Europa, a preferência pelo trabalho remoto, educação à distância, telemedicina, vendas pela Internet e delivery impactaram a locomoção dos cidadãos europeus. Contudo, de acordo com a Valor, setores como o de transporte público podem levar anos para se restabelecer.

Impacto do coronavírus (COVID-19) no transporte público em cidades do mundo inteiro.
Fonte: Relatório Geral (Moovir, 2020).

Marco Lissere, médico infectologista, relata a preocupação das pessoas em relação ao alto risco de contágio em ônibus devido a falta de distanciamento. “É difícil ter segurança em um ambiente onde não há distanciamento, por isso acredito que as pessoas tenham medo e fiquem receosas”, disse o médico para Tribuna de Petrópolis. 

A preocupação e o receio das pessoas ao utilizarem o serviço de transporte público aumenta a cada dia. De acordo com análise no Google Trends, a busca por “covid no onibus” têm aumentado desde fevereiro de 2020.

Pesquisa pelo termo “covid no onibus” aumenta.
Fonte: Google Trends (2020).

Ademais, a Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda a utilização de máscara e álcool em gel nas mãos para quem precisa usar o transporte público, e a Associação Brasileira das Empresas de Transporte Terrestre de Passageiros (Abrati) orienta as empresas que reforcem a higienização dos ônibus, permaneçam atentos à disponibilidade de água e sabão nos sanitários e disponibilizem álcool gel em locais de atendimento.

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Assim como os bondes, o transporte público por ônibus pode desaparecer se essa medida estrutural não for tomada agora

A sobrevivência do setor de transporte público deve ser pensada para o pós-pandemia

No início do século XX, os bondes eram o principal meio de transporte urbano no país. Depois veio a gripe espanhola que instaurou terror no Brasil, acabou matando o presidente eleito Rodrigues Alves e paralisou o comércio e as escolas. 

À medida que a gripe espanhola atravessava as cidades, os sistemas de bondes foram forçados a fazer mudanças centradas na saúde, incluindo a exigência de máscaras nos passageiros, a limitação da capacidade dos bondes e alguns serviços foram desativados brevemente devido à escassez de operadores. No entanto, a grande crise do setor de transporte realmente ocorreu a partir da depressão econômica de 1930 junto com o avanço da política nacionalista varguista.

Hoje, com a pandemia, os principais sistemas de transporte público no país registram perdas de 70 a 80% no número de passageiros. Somado às finanças no vermelho e operadores endividados, entes reguladores têm reduzido drasticamente o serviço, fazendo com que o sistema perca atratividade.

Porém, diferentemente do que ocorreu no pós crise sanitária provocada pela Gripe Espanhola, a situação atual apresenta vertente à uma crise econômica com elevado índice de desemprego, somado ao fato que parte dos antigos passageiros continuarem trabalhando remotamente, enquanto outros podem mudar seus padrões de deslocamento para dirigir, usar aplicativos de transporte ou andar de bicicleta. 

“Sabemos que as pessoas terão medo de usar o transporte público do ponto de vista da saúde.”

Ahmed El-Geneidy, professor de planejamento urbano da Universidade McGill. 

Supondo que a demanda e a receita dos passageiros permaneçam baixas, os reguladores possivelmente terão que manter os cortes nos serviços, mesmo após o fim da quarentena, apesar de necessitar mais oferta, e não menos, para permitir o distanciamento social. Entretanto, hoje não existe dotação orçamentária para o financiamento da improdutividade do transporte público no país. 

A literatura acadêmica mostra que esses cortes podem, por si só, ser um elemento provocador de mais retração da demanda.

 “Existe uma elasticidade que mostra que, se você reduzir o serviço em 10%, geralmente pode esperar um número de passageiros cair 3-6%.”

Greg Erhardt, professor de engenharia civil da Universidade de Kentucky.

Um fator agravante é que 2020 foi o sétimo ano consecutivo do que a NTU apresenta como “tendência perturbadora“, o que se refere ao fato de que o número de passageiros no Brasil está em declínio desde 2013. As explicações para a queda do número de passageiros durante esses anos envolvem crédito fácil para empréstimos para compra de automóveis, a baixa qualidade do serviço para os que não possuem subsídios públicos, surgimento de serviços como Uber e 99, e falta de investimento em infraestrutura.

Quem serão os passageiros na sequência do coronavírus? É certo que os passageiros retornarão inevitavelmente nas regiões mais densas das cidades, porém, pode estar surgindo um novo e potencial nicho para futuros passageiros do transporte: famílias de baixa renda que compraram veículos financiados nos últimos anos.

Temos que realmente tratar o transporte público como um serviço essencial. Não podemos pensar como uma organização com fins lucrativos que ganha dinheiro com o número de passageiros. Neste cenário, o poder concedente deve mudar a forma de remuneração dos operadores, ao invés de serem remunerados pela tarifa, os mesmos deverão ser remunerados pela oferta do serviço. 

Ao mudar a forma de remuneração, há possibilidade de criar uma demanda mais forte por subsídio público, em vez de continuarem dependendo de aumento das tarifas ou da lotação dos veículos. 

Por muitos anos, os políticos apresentam grandes aspirações para o transporte público: que ele supere o transporte individual, lute contra as mudanças climáticas e revitalize as comunidades. Mas as duas coisas que comprovadamente fizeram no último meio século são fornecer mobilidade para quem não tem – seja por idade, renda ou incapacidade – e permitir a função de locais altamente adensados. Sendo assim devemos viver o futuro focando em um dia após o outro. 

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Queda de passageiros no transporte público é mundial

Metrópoles dos EUA e Europa apresentam a mesma queda no número de passageiros constatada no Brasil. 

A acentuada queda no número de passageiros transportados por ônibus no Brasil se estende pelo mundo. Por aqui, entre 2012 e 2017 17% dos usuários deixaram de usar ônibus, segundo a Associação Nacional das Empresas de Transporte Urbano (NTU).

Em Nova York, maior cidade dos Estados Unidos, 176 mil pessoas deixaram a rede pública de transporte (que inclui, além dos ônibus, o metrô, trens, VLT e outros) por dia. No total, as cidades americanas perderam 2% dos passageiros diários de transporte público em 2018 de acordo com a APTA (Associação do Transporte Público Americano). Quedas se repetem em grandes cidades como Los Angeles e Chicago.

Londres, por sua vez, manteve um número próximo e deixou de transportar diariamente 106 mil pessoas.

Os ônibus, como mostram os dados, são os mais afetados. Algo que acontece também no Brasil, pois a queda no número de passageiros relatada no início do texto não se estende à malha ferroviária: o transporte sob trilhos teve alta de 21% em passageiros durante 2018, número alavancado pela execução de ampliamentos e lançamento de novas linhas, ainda que de maneira devagar.

As causas para as diminuições de demanda são diversas, tanto aqui no Brasil como nos Estados Unidos ou Europa. Maior preocupação com a qualidade de vida de seus funcionários por parte das empresas, que estimulam o home office, incentivo ao uso do transporte individual, sobretudo no Brasil, além da chamada “micro mobilidade”, que inclui patinetes e bicicletas alugadas.

Tudo isso, porém, gera para o transporte público o ônus de lidar com as viagens mais longas – até as periferias – e que são as mais custosas, enquanto as viagens curtas que pagam esses deslocamentos distantes acabam ficando nas mãos da micro mobilidade, de carros compartilhados ou até mesmo do andar a pé.

Para Edmundo Pinheiro, presidente da HP Transportes “De modo geral, as viagens curtas e médias ajudam a equilibrar o custo das viagens longas. A perda dessas viagens menores, que estão indo para aplicativos e bicicletas, gera ainda mais desequilíbrio.”

Essa tendência leva o transporte público a um ciclo vicioso: menos pessoas andando, menos dinheiro em caixa, menos investimentos em melhoria, menos atrativo fica o transporte, menos pessoas andando…

Dessa forma, empresas de transporte e prefeituras do mundo todo buscam opções para gerar novas receitas ao transporte, evitando que o preço da passagem seja o único indutor de investimentos e, por consequência, transforme quem ainda usa o transporte público no único responsável pela prestação dos serviços.

A HP Transportes, que atua em Goiânia, lançou recentemente um serviço de vans sob demanda. Sendo solicitado pelos usuários, as vans só circulam com passageiros e toda viagem se paga sozinha. Com receitas de serviços paralelos como esse empresas de transporte esperam reverter a lógica negativa atual e bater de frente com grandes players, como Uber.

“No futuro, a receita desse serviço poderá ajudar a custear o sistema”, afirma Edmundo Pinheiro, em entrevista à Folha.

Outro ponto é a integração de diversos modais, tanto em cidades próximas nas Regiões Metropolitanas, como em conjunto ao modais recentemente disponíveis. A prefeitura de São Paulo publicou edital em que prevê a digitalização do Bilhete Único e, com isso, abre-se margem, por exemplo, para que o mesmo bilhete digital seja usado no metrô ou numa bicicleta.

O caminho, entretanto, passa por diversos agentes que precisam estar interessados na integração e melhoria constante dos serviços.

Para saber mais: 

O que falta para termos um sistema de transporte público que atraia os usuários?