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Tomada de decisão das três instâncias políticas dentro de SP são destaques para mobilidade urbana

Governador, prefeito e vereador propõem mudanças para a mobilidade urbana nas cidades de SP que alteram subsídios, gratuidade e nova proposta para uso do cartão de ônibus em táxis

O sistema de transporte público vive iminência de colapso e tem acumulado cada vez mais prejuízos durante a pandemia. Nesse momento, a tomada de decisão do Governador do Estado de São Paulo, Prefeito de Assis e Vereador de Itapevi, ambas cidades do interior de São Paulo, são destaques pelo impacto no setor.

Na última quarta-feira, dia 24 de fevereiro de 2021, o Governador de São Paulo, João Doria (PSDB) vetou integralmente o passe livre no transporte público de agentes de segurança. Segundo os autores, o Projeto de Lei visava garantir aos membros das forças de segurança o direito ao passe livre nos ônibus intermunicipais e nos trens da CPTM e do Metrô.

Na prática, o projeto visa garantir em lei um direito hoje regulamentado por uma portaria da Artesp (Agência de Transporte do Estado de São Paulo) que é assegurado somente aos policiais militares que estiverem fardados. Porém, de acordo com o governador, o PL é inconstitucional pois não cabe a uma agência reguladora assegurar o benefício, mas sim ao Poder Executivo, através das Constituições Federal e Estadual.

No mesmo dia, o Prefeito de Assis, José Fernandes (PDT) decretou gratuidade no transporte público enquanto perdurar a pandemia. A medida visa diminuir o déficit financeiro no sistema, uma vez que o custo operacional tem sido muito maior do que o valor recolhido pela tarifa paga por usuários.

A Prefeitura da cidade já vem subsidiando o sistema, na forma da Lei, a fim de garantir a prestação do serviço público, dessa forma, no decreto, a prefeitura passa a se responsabilizar integralmente pelo custo do transporte. O modelo de financiamento em Assis, observado também na maioria das cidades brasileiras, já tem se demonstrado insuficiente há muito tempo, sendo necessária a revisão e implantação de outras medidas para subsídio.

Seguindo para Itapevi, município que se localiza a 41 km da capital, a proposta para sustentação da mobilidade urbana é outra. O vereador Bruxão Cavanha (PL) propôs a utilização do bilhete de transporte público para pagamento de corridas de táxis na cidade. O pedido, que já havia sido apresentado em 2019, é discutido pela Câmara Municipal desde 2016.

Como justificativa, Bruxão levantou o decreto n°58639/2019, criado pela prefeitura de São Paulo que projeta a criação de uma alternativa virtual ao cartão de plástico e também a possibilidade do uso do bilhete único como pagamento de transporte particular, como táxi. 

“A proposta visa facilitar a vida cotidiana de quem precisa utilizar o transporte público em Itapevi. Assim, o itapeviense poderá pagar o ônibus e o táxi com o mesmo bilhete”

afirmou Bruxão em sessão da Câmara Municipal de Itapevi em 2020.

No entanto, a problemática da proposta está no fato de que o sistema de bilhetagem eletrônica presente na cidade não possui artifícios capazes de sustentar a utilização para pagamento em outro meio de transporte. A aplicação do bilhete de transporte deve compreender características de interoperabilidade, como as presentes na bilhetagem digital.

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Agora é simples com ONBOARD #48

Por que o transporte público gratuito também precisa de bilhetagem?

A bilhetagem é um sistema que auxilia o controle de acesso de pessoas e pode ser implementado em diversos setores como os de entretenimento, industrial ou empresarial. 

No transporte público, a bilhetagem corresponde a um sistema de emissão, venda e validação de bilhetes.  Várias cidades brasileiras já possuem o sistema instalado em ônibus, trens e metros.

No entanto, ao falar de transporte público gratuito, muitos podem pensar que não há necessidade da bilhetagem e é aqui que se enganam!

O sistema inserido no transporte é um grande aliado para o planejamento operacional, tático e estratégico, pois auxilia no entendimento de diversos públicos e seus deslocamentos.

Sua implementação correta pode contribuir para o controle do serviço prestado, maior eficiência produtiva, planejamento de demanda, integração multimodal e mais. 

Leia na íntegra: As vantagens de possuir um sistema de bilhetagem no transporte público gratuito.

Sem auxílio governamental, transporte público se depara com necessidade urgente de rever suas políticas de financiamento. Países pelo mundo buscam novas formas de financiamento para o transporte público, conheça as sete principais. Saiba mais.

Problemática do acordo entre o Governo de MG e a Vale para a mobilidade urbana da capital. A construção de um rodoanel com a promessa de gerar mais empregos e resolver o trânsito na cidade bate de frente com estudos científicos e a opinião de especialistas do setor. Saiba mais.


Rapidinhas: Os links que nos deram insights durante a semana. 

Tecnologia blockchain pode auxiliar no controle do transporte público em Teresina, no Piauí. O objetivo é desenvolver “transparência e compartilhamento das informações de sistemas”.

Idec é contra o reajuste de 25,5% no preço das tarifas do sistema de trens urbanos no Rio de Janeiro. O Instituto de Defesa do Consumidor aponta que o aumento impactará 12 municípios.

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Por que o transporte público gratuito também precisa de bilhetagem?

Uma visão panorâmica da bilhetagem no transporte público e suas vantagens em um sistema gratuito

A bilhetagem é um sistema utilizado em diversos setores que demandam controle de acesso de pessoas, como os de entretenimento, industrial ou empresarial. Com o avanço da tecnologia, a bilhetagem passou a se caracterizar como um sistema automático, o que permitiu uma maior eficiência em inúmeros processos e serviços. 

Todo sistema de bilhetagem é composto por pelo menos um software e um hardware. O primeiro geralmente fornece um banco de dados e pode auxiliar na gestão das informações, enquanto o segundo representa o equipamento pelo qual haverá a validação da tecnologia imposta para controle, seja um bilhete, ticket, cartão, biometria ou análogo.

No transporte público, a bilhetagem corresponde a um sistema de emissão, venda e validação de bilhetes. A partir de uma pesquisa realizada pela ANTP (Associação Nacional de Transporte Público), as tecnologias utilizadas para validação em transporte público têm se desenvolvido cada vez mais e o uso de smartcards contactless, ou seja, sem contato, tem crescido durante os anos.

Várias cidades brasileiras já possuem ou estão estudando a implantação de sistemas de bilhetagem. Em sua grande maioria, há uma parceria entre o setor público e privado, onde empresários compram os equipamentos e a concepção e implantação do sistema são realizadas em conjunto, permitindo que operadores e Estado tenham acesso aos dados, podendo usá-los como política de transparência, o que geralmente não ocorre na prática.

Há diversos ganhos com a implementação do sistema, desde o controle de arrecadação até redução de custos com a dispensa de cobradores, por exemplo. Todavia, quando abordamos a possibilidade da maioria dos municípios brasileiros oferecerem transporte público gratuito à sociedade, esses argumentos não condizem com o propósito da gratuidade e fica a dúvida sobre a real importância do sistema.

A bilhetagem pode proporcionar uma eficiência enorme em todos os setores empresariais. Para isso, é importante que o sistema contemple todas as necessidades das pessoas que utilizam o serviço, seja cliente, órgão gestor, operador, empregado ou proprietário de empresa. Para isso, analisamos as principais oportunidades que o sistema pode oferecer e vamos tratar delas aqui.

Controle do serviço prestado

Com a implementação de um sistema de bilhetagem integrado é possível recolher informações para a fiscalização da empresa operadora ou do órgão gestor, dados sobre número de passageiros transportados por ônibus, linha e faixa horária, número de veículos em operação, tempo de viagem, entre outros. Informações fundamentais para qualidade e sustentabilidade de uma operação como esta, evitando lotações e o uso ineficiente dos recursos. 

A partir dessas informações, o planejamento do sistema de transporte se torna mais eficaz, trabalhando com as ferramentas adequadas para não haver ônibus lotados ou vazios em funcionamento.

Maior eficiência

A automação dos processos produtivos traz inúmeras modificações, principalmente sobre a melhora da produtividade. Com um sistema de bilhetagem é possível otimizar o gerenciamento com a rapidez de informações acerca dos hábitos de clientes, como rota e horário. Dessa forma, a coleta de dados para projeção da oferta e demanda, por exemplo, passa a ser automatizada, evitando custos exacerbados dessa pesquisa.

Além disso, o sistema de bilhetagem pode assumir a função de outros dispositivos embarcados, como por exemplo AVL, UCP e outras funcionalidades. Neste caso, a integração e a usabilidade aumentam a produtividade, pois permite o cruzamento de dados necessários para eficácia do planejamento e operação do transporte público coletivo.

Fonte: ONBOARD.

Planejamento de demanda

A obtenção de dados sobre a quantidade de passageiros por linha, local e faixa horária possibilita o planejamento pleno da demanda. Essas informações são importantes inclusive para indicar as sazonalidades horárias, diárias, semanais, mensais e locais de cada veículo.

Ao mesmo tempo, possibilita o planejamento de alocação de frota e mão-de-obra de forma racional e produtiva, permite conhecer a origem e o destino das viagens, entrada de usuários por ponto de parada, trecho de maior carregamento, velocidade dos veículos em cada ponto e vários outros dados importantes para a realização de um planejamento operacional eficiente. 

Contagem de passageiros automática em transporte público coletivo. Arquivo disponibilizado pela ONBOARD.

Integração multimodal

A integração intra e entre os diversos modos de transporte é uma preocupação de vários municípios. Nas últimas décadas, a solução para um sistema integrado era a construção de terminais com transferência livre, o que apresentava alto custo e, em sua grande maioria, era inviabilizado.

Com a Bilhetagem Digital é possível oferecer uma integração com baixo custo de implantação, pois é possível instalá-la em qualquer ponto, sem a necessidade de terminais e grandes estruturas. Além disso, influencia o comportamento dos usuários através da possibilidade de maximizar a utilização da infraestrutura de transporte coletivo.

Monitoramento do desempenho da oferta

A coleta de dados não garante o efetivo gerenciamento. No entanto, a partir do banco de dados gerado é possível avaliar toda qualidade de serviços prestados. O estabelecimento de um padrão de desempenho pode ser definido para a operação, no que se refere a segurança, conforto, vida útil de veículos, vistorias e etc, cruzando dados para melhoria do sistema. Isso permite ajustes na operação para melhor atender aos passageiros e clientes finais.

Possibilidades de nicho

A bilhetagem pode auxiliar no entendimento de diversos públicos e seus deslocamentos a fim de estruturar uma operação orientada aos passageiros. Pois, dentro de um mesmo sistema, há pessoas que desejam fazer deslocamentos curtos, longos, pessoas que utilizam o serviço esporadicamente e outras frequentemente, que utilizam em horários de pico e outros não, usuários que têm que fazer baldeação ou viagem simples, pessoas que pagam o serviço adiantado e outras que pagam na hora do consumo, entre inúmeros casos. Assim, com um sistema de bilhetagem aplicado corretamente, é possível disponibilizar um serviço que atenda públicos distintos homogeneamente.

Atualmente, a bilhetagem eletrônica não consegue entregar um serviço que atenda satisfatoriamente os pontos levantados, além de ser um serviço extremamente caro e gerar uma série de atritos durante sua utilização. 

Para a obtenção de melhorias, é necessário que os sistemas possam ter interface amigável, integrada e segura, além do planejamento estar alinhado com os objetivos e expectativas de todas as pessoas que utilizam o transporte, seja poder público, privado ou usuário. Assim, a Bilhetagem Digital é a melhor alternativa, pois se torna a grande responsável pela devolução da competitividade do serviço e para solucionar os desafios atuais do setor.

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Viabilidade e inconsistências da gratuidade no transporte público: um estudo de caso em Paulínia/SP

O transporte público gratuito é sonho de muitos e viável para a maioria das cidades brasileiras, mas por que não é usualmente aplicável? Conheça o caso de Paulínia, interior de São Paulo

Foto: Câmara Municipal de Paulínia.

O transporte público gratuito está entre as soluções mais interessantes para cidades. A tarifa zero no transporte apresenta potencial para melhorar o trânsito, o bem-estar e a qualidade de vida não só de quem usa as redes, mas de toda a população, além do transporte ser mais eficiente, ecológico e econômico. 

Hoje, o transporte coletivo no país se mantém com R$ 59 bilhões ao ano, sendo que 89,8% vem de tarifas pagas pelos passageiros, 10,2% de incentivos públicos, enquanto as receitas não tarifárias (como publicidade) correspondem a R$ 375 mil, menos que 1% do valor total (Inesc, 2019). 

Um estudo divulgado em outubro de 2019 pelo Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) revelou que a oferta de transporte gratuito ou com tarifas reduzidas é viável na maior parte das cidades brasileiras. Isso se daria através de aumentos na arrecadação de impostos como IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano) e IPVA (Propriedade de Veículos Automotores), o que implicaria em parte da população pagar mais impostos, principalmente os que possuem maior renda e/ou que morasse em regiões valorizadas pela oferta de ônibus e metrô e/ou proprietários de automóveis.

Ainda assim, mesmo sem aplicação dos cenários propostos pelo estudo, a União destina recursos plurianuais para programas de mobilidade urbana que priorizam o transporte público em detrimento do privado. No entanto, em uma análise entre 2008 e 2019, apenas 27,2% dos recursos pagos pela União foram efetivamente gastos por estados e municípios. Ou seja, o dinheiro estava à disposição, porém não houve elaboração de planos suficientes para o uso.

Período do plano plurianualRecurso pago pela União* (R$)Percentual utilizado pelos municípios
2008 – 20113.021.022.431,820,09%
2012 – 201514.003.916.104,1810%
2016 – 20192.913.553.664,9740%
* Atualizado pelo IPCA. Fonte: Siga Brasil e Inesc (2019).

Hoje, no Brasil, 15 municípios já atuam com transporte gratuito, sendo que a maioria corresponde a cidades pequenas no interior que necessitam de poucos veículos para atender a população. No entanto, existem pontos que devem ser considerados para a aplicação do sistema no país e, para isso, vamos abordar neste artigo o caso da cidade de Paulínia/SP.

Tarifa zero no transporte em Paulínia/SP

Paulínia compreende quase 107 mil habitantes (IBGE, 2018) e apresenta um crescimento de 4,82% anual.  A cidade foi a primeira a adotar a gratuidade no transporte público municipal através da Lei nº 1922 aprovada em 1995. A lei ainda isentava o pagamento do ISS (Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza) a empresa que efetuasse o transporte coletivo urbano na cidade.

No entanto, em 1997, a lei foi revogada e o sistema começou a funcionar em modo de concessão. Assim, a remuneração da Concessionária passou a ser proveniente da cobrança de tarifas pagas diretamente por usuários do transporte, possibilitando gratuidades apenas a estudantes, desempregados, deficientes físicos e idosos acima de 60 anos, além de 30% de desconto no Passe Comum Social.

Porém, em 1999, o município suspendeu a gratuidade para desempregados e o desconto do Passe Comum Social.

Seguindo para 2013, depois dos protestos que tomaram as ruas de todo o País no mês de junho, o prefeito Edson Moura Jr (PMDB) afirmou em sua cerimônia de diplomação que a tarifa de ônibus na cidade de Paulínia passaria a ser integralmente subsidiada pelo município novamente.

Na época, o valor da passagem de ônibus custava R$ 2,60, sendo que R$ 1,60 era subsidiado pela prefeitura e o valor repassado para a população era de apenas R$ 1, além de ser gratuito aos domingos e feriados e para pessoas com renda de até dois salários mínimos. Com a nova proposta, o valor estimado para custear o transporte seria de R$ 29 milhões ao ano.

“A cidade é muito rica, arrecada por mês R$ 80 milhões, não tem razão para não subsidiar integralmente a passagem“, disse a assessoria da administração da Prefeitura por meio de nota na época.

De acordo com levantamento da Associação Transparência Municipal de 2013, Paulínia se encontrava, pela primeira vez, entre os municípios bilionários do país, cidades cuja receita orçamentária ultrapassava 1 bilhão de reais em 2013. Segundo os dados, o município apresentava como Receita Orçamentária R$ 1.081.594.200.

No entanto, o projeto foi reprovado. As justificativas dos votos contrários se referiam à falta de um estudo de impacto no transporte público da cidade caso a tarifa fosse zerada, além do projeto não apresentar propostas caso a empresa tivesse que aumentar a frota em determinadas regiões. 

Já em 2018, a gratuidade aos domingos e feriados foi suspensa, sendo cobrado R$1 como nos dias comuns. Segundo a prefeitura, a medida foi adotada para reduzir os prejuízos causados por atos de vandalismo no ônibus. “Os relatos [de vandalismo] foram feitos por um grande número de passageiros, cobradores, motoristas e da própria concessionária do serviço, que há anos enfrenta o problema”, informava a prefeitura em nota.

Essa mudança afetou consideravelmente a demanda de ônibus em domingos e feriados, o que fez com que a Prefeitura reduzisse a oferta. A decisão teve como base um levantamento da empresa Viação Passaredo, que apontou uma diminuição no número de usuários do serviço desde que a tarifa de R$ 1 passou a ser cobrada. 

Em maio de 2019, o valor da tarifa teve reajuste de 22,81% que seria repassado aos usuários, mas por conta da determinação do prefeito Antonio Miguel Ferrari, o Loira, hoje, ex-prefeito, o município manteve a passagem a R$ 1. Caso ocorresse o aumento para os usuários, o reajuste seria de 65%, segundo nota da prefeitura.

Por fim, em dezembro de 2019, houve troca de empresa operadora de transporte público urbano e rural da cidade. O novo contrato com  a Terra Auto Viação previa uma redução de custos na ordem de R$ 1,9 milhão nos cofres públicos. Atualmente, a concessionária opera com 52 coletivos no município, mantendo outros cinco em reserva, totalizando 57. Em média, 750 mil pessoas por mês utilizam o transporte público em Paulínia (Portal da Transparência de Paulínia/SP, 2018). 

Inconsistências da gratuidade no transporte público urbano

Embora a solução da Tarifa zero seja passível de ser aplicada e contribua para uma maior aderência de clientes no transporte, é uma decisão que precisa ser tomada com cautela. O documento “Debates: Projeto Tarifa Zero”, produzido pelo PT de São Paulo em 1990, traz diversos relatos e questionamentos referentes ao programa, como a de Carlos Zarattini, hoje deputado federal: 

“Abolir a cobrança é um caminho acertado? Outro assunto pouco discutido em nosso meio é a abolição da relação mercantil que se materializa na tarifa. Será esse um caminho que educa as massas ou as deseduca? […] parece equivocado afirmar que a educação e a saúde pública têm tarifa zero, não sofrem vandalismo. Qualquer um que conhece as escolas e hospitais percebe o alto grau de degradação e abandono. Não será isso uma forma de vandalismo dos próprios funcionários, abandonados pelos governantes?”

Zarattini traz pontos que não são abordados nos estudos de viabilidade da tarifa zero, mas que influenciam na análise econômica pós inserção do programa. Foi comprovado cientificamente que as pessoas não costumam valorizar o que é grátis. O caso de Paulínia é um bom exemplo, onde houve relatos de vandalismo no transporte nos dias de gratuidade.

Outro exemplo ocorreu na pequena cidade de Templin (cerca de 15 mil habitantes) na Alemanha. A gratuidade no transporte foi introduzida em 1997 e o que observou foi um aumento de passageiros de 1200% em 3 anos, sendo a maioria crianças e jovens, isso levou a um problema crescente de vandalismo (CATS et al., 2017).

A problemática na oferta do transporte público gratuito também envolve o uso exacerbado do serviço de modo a superar sua real função na sociedade. Embora existam fortes evidências de que seu uso está atrelado à classe social, uma vez que os ricos usam muito menos do que os pobres, estudos demonstram que oferecer um transporte gratuito é fornecer um serviço não somente aos usuários que mais precisam, mas a todos cidadãos, incluindo a população mais rica e o público motorizado/que possui automóveis.

Em um experimento realizado em Chapel Hill, na Carolina do Norte/EUA, com uma população por volta de 60 mil habitantes. A política de gratuidade no transporte público foi implementada em 2002 depois de realizar uma análise que mostrou que as receitas tarifárias (passageiros pagantes) eram relativamente baixas – cerca de 8% dos custos operacionais. Assim, após a implementação do transporte gratuito, o número de passageiros aumentou 43% durante o período de 9 meses (VOLINSKI, 2012).

O mesmo aconteceu em Copenhage, Dinamarca, onde pesquisadores forneciam um cartão de viagens grátis para proprietários de carros, revelou que, enquanto a promoção esteve vigente, houve um aumento significativo do deslocamento em transporte público, no entanto, a demanda caiu quando o plano expirou.

Assim, ao inserir a política de gratuidade ao transporte público, conclui-se que a demanda cresce consideravelmente em um curto espaço de tempo, o que, sem um planejamento correto, pode acarretar na queda da qualidade de serviço e superlotação, o que, neste momento, deve ser evitado.

Considerações finais

Embora este estudo de caso se baseie em uma variedade de fontes citadas e confiáveis, deve ser considerado como um primeiro passo em direção a um mapeamento e estudo abrangente de longo prazo de todos os casos de Tarifa Zero. Além da necessidade de analisar social e economicamente cada município brasileiro, entendendo suas próprias características e condições.

No entanto, pesquisadores da área apontam que para agir no modo de priorização do transporte urbano e desincentivo ao uso do carro, políticas relacionadas a taxas de congestionamento, estacionamento rotativo, preços de combustível e outros, podem resultar em uma mudança maior do que os ganhos pela redução das tarifas de transporte público.

Mesmo assim, deve-se considerar que subsídios ao transporte sejam aplicados de forma adequada, ou seja, promovendo maior qualidade e redistribuição, facilitando o acesso para a população que mais utiliza e necessita do transporte público, além de contribuir para uma mobilidade sustentável e não perder caráter atrativo e competitivo.

REFERÊNCIAS

CARVALHO, C.H.R. Financiamento extratarifário da operação dos serviços de transporte público urbano no Brasil. Inesc (Instituto de Estudos Socioeconômicos), 2019.

CATS, O.; SUSILO, Y.O.; REIMAL, T. The prospects of fare-free public transport: evidence from Tallinn. Transportation, v. 44, n. 5, p. 1083-1104, 2017.

DIRETÓRIO MUNICIPAL DO PARTIDO DOS TRABALHADORES DE SÃO PAULO. Tribuna de Debates: Debate sobre o projeto Tarifa Zero. São Paulo: Diretório Municipal PT/SP, nov. 1990.

DOMINGUES, Letícia Birchal. Deliberação, conflito e movimentos sociais: um estudo de caso das práticas de organização e tomada de decisão do Tarifa Zero BH. Agenda Política, v. 6, n. 1, p. 130-157, 2018.

FIX, M.; RIBEIRO, G.E.; PRADO, A.D. Mobilidade urbana e direito à cidade: uma entrevista com Lúcio Gregori sobre transporte coletivo e Tarifa Zero. Rev. Bras. Estud. Urbanos Reg., v.17, n.3, p.175-191. Recife, 2015.

KĘBŁOWSKI, Wojciech. Why (not) abolish fares? Exploring the global geography of fare-free public transport. Transportation, p. 1-29, 2019. 

Portal da Transparência de Paulínia/SP. Documento de Audiência Pública, 2018. Disponível em: <http://www.paulinia.sp.gov.br/downloads/transp/>. Acesso em: 07 de janeiro de 2021.

SCHIAFFINO, D.P.L; TOLEDO, J.I.F.; RIBEIRO, R.G. Tarifa Zero uma reflexão sobre a proposta. ANTP. 2015. Disponível em<http://files-server.antp.org.br/_5dotSystem/download/dcmDocument/2015/06/15/C088AE18-A9D3-4CCD-9A56-F54E04438370.pdf>. Acesso em: 11 de janeiro de 2021.

STORCHMANN, K. Externalities by automobiles and fare-free transit in Germany—A paradigm shift?. Journal of Public Transportation, v. 6, n. 4, p. 5, 2003.

VOLINSKI, J. Implementation and outcomes of fare-free transit systems. Transit Cooperative Research Program. TCRP Synthesis, p. 101, 2012.

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Conheça as cidades do RJ e SP que estão apostando no transporte público gratuito

Prefeitura de Maricá ampliará frota de ônibus para cobrir todos distritos com a tarifa zero, enquanto Bragança Paulista aposta no modelo apenas na região central da cidade

Foto: Suyla Maria Marques da Silva/EyeEm.

O transporte público gratuito existe em 15 municípios brasileiros e é viável em muitos outros. Dentre os que já possuem, Maricá/RJ foi o primeiro com mais de 100 mil habitantes a implantar a tarifa zero. O serviço teve início em 2013 e era ativo em apenas uma parte da cidade, porém, começa o ano de 2021 com ampliação da frota e atendimento em todos os bairros.

Essa modificação se deu devido ao fim do contrato de concessão da empresa privada, a viação Nossa Senhora do Amparo, no final de 2020. A partir de agora, a Empresa Pública de Transportes (EPT), que pertence à Prefeitura de Maricá, assumirá o direito de atender todos os bairros e moradores da cidade.

De acordo com o Idec (Instituto de Pesquisa e Defesa do Consumidor), antes de expandir para a cidade inteira, a Prefeitura tinha um investimento de R$15 milhões anuais. Com a mudança, a expectativa é de que o número de deslocamentos de passageiros passe de 21 mil por dia para mais de 50 mil, salvo mudanças durante a pandemia.

“Existe uma previsão de que comecemos a operar nesses distritos no fim de fevereiro, início de março. A perspectiva é a de que o número de deslocamentos de pessoas passe dos atuais 21 mil por dia para mais de 50 mil por dia, cobrindo todo o município”

presidente da EPT, Celso Haddad.

Segundo a Prefeitura, o contrato com a antiga empresa terminou em outubro do ano passado, mas em decorrência de um termo aditivo, o serviço foi prorrogado até abril de 2021 para que a prefeitura possa concluir o processo de licitação dos novos ônibus. Assim, a partir do início das operações, previstas entre março e abril deste ano, o novo serviço será gratuito à toda população e passará a atender todos os bairros de Maricá.

Bragança Paulista, em São Paulo, também implementa transporte público gratuito

Seguindo na mesma linha, a Prefeitura de Bragança Paulista em SP passou a disponibilizar transporte público gratuito na região central após a empresa JTP Transportes vencer a licitação. O objetivo é incentivar as pessoas a utilizarem o transporte coletivo e reduzir o fluxo de veículos.

A antiga empresa foi responsável pelo transporte na cidade por 57 anos e agora se encontra na justiça pois, de acordo com a Prefeitura de Bragança Paulista a empresa “se negou a enviar” todos os dados de cadastro de passageiros no sistema de bilhetagem eletrônica para que a nova companhia fizesse a leitura pelos validadores dos saldos ainda existente nos cartões de transporte.

Na troca de concessão, houve redução de apenas 1 centavo no valor da tarifa de ônibus, o que não faz diferença visto que não há troco. Logo, a previsão de reajuste deverá ocorrer um ano após o início da operação da JTP, observando-se a anualidade.

A Prefeitura acredita que a empresa tenha em média cerca de 543 mil usuários por mês. Logo, caso haja menos passageiros do que isto, a Prefeitura deve pagar um subsídio tarifário para a empresa e, caso o número de passageiros seja maior, a empresa pagará à Prefeitura.

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